31.3.11

O homem invisível

Menos direitos sociais e laborais, salários muito mais baixos, habitações mais precárias, etc. Vivem entre nós, são mesmo os mais vulneráveis à pobreza e à crise, mas a sua situação está totalmente ausente do debate político. Em Espanha. Ou noutro lugar qualquer.

30.3.11

Accountability

Julgo que muito pior do que um político que não cumpre algo a que se comprometera em determinado momento (no programa eleitoral, por exemplo), é um político que não se chega a comprometer com nada em concreto. Ou que se compromete com uma coisa e o seu contrário. O primeiro, permite o escrutínio, o controlo democrático pelos restantes actores políticos e, em geral, pelo povo. Permite a responsabilização política. O outro, omite qualquer critério ou parâmetro a partir do qual se possa realizar este controlo, momento fundamental em democracia. É, politicamente, inimputável.

29.3.11

Tens razão, Pedro...

...não é difícil reconhcer o génio. E que génio, deus meu. Desde o início:

Contradições*

Confesso que, por norma, não faço um juízo muito severo das incoerências e contradições das pessoas ao longo do tempo. Sou, para dizer a verdade, bastante tolerante quanto a este tópico. Se não faço com as pessoas, também não me inclino a fazer isso com os políticos. Justificação. Há, por um lado, a questão pragmática: é inevitável que isto aconteça. Rendo-me ao lugar-comum. Só os burros é que não mudam. E os fanáticos, o que dará no mesmo. Mudamos porque, enquanto seres inteligentes, a nossa posição tende a estar relacionada com a interpretação que fazemos do mundo que nos rodeia. Mudando as circunstâncias, também nós tenderemos a mudar. Muitas vezes muda apenas uma intuição, uma ligeira mudança de ângulo. Felizmente, as pessoas não têm de andar a prestar contas de todas estas mudanças. Não quer dizer que não possa ser, por vezes, um exercício estimulante e enriquecedor, embora outras vezes seja apenas inútil. Gostava de ir à praia. Já não gosto de ir à praia. Contrariamente às pessoas, os políticos têm como principal dever prestar contas. Mudar de posição é, pois, natural, mesmo para os políticos, desde que fundamentem as razões dessa mudança. Parêntesis. Os partidos competem por votos, o que fazem através de ideias, de um projecto, de uma narrativa. Fecha parêntesis. Na ausência de uma explicação que enquadre as posições na narrativa isso não quer dizer verdadeiramente que não haja uma explicação. Há. É eleitoralismo, puro, que é a competição por votos a troco de… nada. Como Isto:


Ou isto, como denuncia Pacheco Pereira:


* a distinção pessoas e políticos era piada. Falhada, mas piada.

É isto!

Às vezes há posts assim. Não terão para muitos nada de especial. Não terão provavelmente mesmo nada de especial. Mas, na forma como o dizem. Na sua simplcidade. No tom e nas palavras com que o dizem, fazem-me ter vontade de me levantar da cadeira e dizer, alto e bom som: é isto!

“Caro José Neves, a resposta é simples: a esquerda que valoriza as declarações de Merkel é a mesma esquerda que, independentemente do juízo que possa fazer sobre as opções políticas da chanceler alemã e sobre a forma como esta tem influenciado a resposta europeia à crise, sabe que não haverá nenhuma solução europeia realista que dispense a Alemanha. Se me perguntarem o que penso das políticas da senhora Merkel, eu direi que são desastrosas e que se arriscam a lançar a Zona Euro numa recessão sem fim. Dizer que devemos 'bater o pé' à senhora Merkel, ou outra qualquer bravata inconsequente desse género, não invalida o facto de essa ser, hoje, a liderança que o país mais poderoso da UE escolheu e que, por isso, as suas posições - boas, más, pessimas, o que for - são, para quem tenha o azar de viver na realidade política que existe, aquelas com que temos de lidar.”

João Galamba, Jugular, num texto já com alguns dias.

Desculpem-me. É só para não me esquecer de ler esta entrevista

Entrevista a Howard Jacobson, I

"Está um dia lindo, o sol brilha e parece que passámos do Inverno directamente para o Verão. Estão 20 graus lá fora, imagine só". Seguem-se descrições da fauna e flora que por estes dias aparece a desabrochar ou a pipilar pelo terraço de Howard Jacobson. Ao telefone a partir da sua casa em Londres, o escritor inglês, 68 anos, está bem disposto apesar de ligeiramente ressacado - "bebi uns copos ontem depois de uma palestra sobre censura". Goza ainda do estado de graça concedido pelo Man Booker Prize, distinção que recebeu em Outubro do ano passado à custa de "A Questão Finkler", livro que saiu na quinta-feira em Portugal. "O prémio fez de mim uma pessoa melhor mas calculo que por pouco tempo. Assim que os efeitos desta vitória se dissiparem vai voltar a amargura". É aproveitar.

Como é que o Booker mudou a sua vida?

Em termos muito práticos, vendo muito mais livros agora do que alguma vez vendi. Por exemplo: a cópia em inglês de "A Questão Finkler" vendeu mais de 400.000 exemplares, um número colossal e que significa que eu em breve terei vendido mais exemplares deste livro do que todos os meus outros 11 romances juntos. É óptimo ter leitores, não tenho de lhe dizer isso a si, certo? E é maravilhoso perceber que há gente a lê-lo no Paquistão e será traduzido para mais de 23 línguas.


Também lhe deve ter aumentado a confiança, certo?


Um alívio enorme. A partir de agora não tenho de me preocupar com ter ou não ter leitores e se posso viver da literatura. Em tempos angustiava-me ter um livro novo, ir a uma livraria e não o encontrar em lado nenhum. Isso agora já não volta a acontecer tão depressa - em Londres vi paredes inteiras forradas a livros meus.


É uma libertação.


E também é uma espécie de ressurreição dos meus livros anteriores. Estão de volta, têm capas novas, estão a ser publicados em mercados onde nunca chegaram, vão ser traduzidos. É como se toda a minha carreira como escritor fosse rejuvenescida. O que também é perigoso.


Perigoso porquê?


Porque me sinto mais jovem do que realmente sou. Esqueço-me de que vou morrer em breve ou de me comportar com a dignidade que se espera de uma pessoa com a minha idade.


E a sua escrita será afectada?


Sou um escritor pessimista. Os meus livros e a minha carreira estão assentes na ideia de que a minha vida é um fracasso, faço a minha arte a partir daí. De agora em diante tenho de fazer o mesmo a partir da sensação de que a minha vida é um sucesso. Se será um problema? Veremos.


A vitória no Booker foi uma surpresa.


Eu também fiquei surpreendido. Naquela noite não achei que fosse ganhar [era a terceira nomeação]. Mas o que mais me surpreendeu foi o "bruaá" de apreço que veio da audiência. Parece que, além de mim, havia mais gente satisfeita.


O "Daily Telegraph" dizia que o Howard era "demasiado divertido para o Booker"?


Muita gente disse isso - eu próprio o disse. Passei anos a ver livros sérios ganhar esse prémio e a achar que aquilo não era para mim. Não percebo esta aversão ao humor na grande literatura, esse afastamento da seriedade. Acho que todos os romances devem ser cómicos.


Como assim?


É para isso que os romances servem. Repare: temos a poesia, temos a tragédia, temos outros géneros para lidar com coisas muito específicas. O romance trata do dia-a-dia, trata da vida. E a nossa vida é bela, feia e absurda. Um romance deve reflectir isso - e deve ter humor.


Acha que o humor é subvalorizado junto da alta cultura?


Sem dúvida. A literatura começou a tornar-se uma coisa tão séria e respeitada que acaba por ser vista quase como uma religião. Inglaterra é um lugar onde a religião organizada está a desaparecer e parece que a arte tomou esse lugar. A literatura deve ser uma coisa solene, silenciosa e a cheirar a igreja - velas, incenso, gente a ler em altares, essas coisas. As pessoas têm medo que, ao abrir um livro com piada, este se lhes rebente nas mãos. E isso é terrível porque em toda a história da literatura há grandes romances que nos fazem rir: "Gargantua e Pantagruel", de Rabelais, "D. Quixote", de Cervantes, são tudo novelas que fazem troça do estado ou da religião. Era para isso que os romances serviam. Mas de há 50 ou 100 anos para cá tudo mudou.


Tem medo de não ser levado a sério?


Não sei como é em Portugal, mas cá os heróis da nossa cultura são comediantes. Adoramo-los. Mas estamos à vontade quando eles estão no seu território - fazem umas piadas e já está. Quando o humor passa para outras áreas aí começam os problemas. As pessoas ficam confusas, não sabem o que pensar, ficam ofendidas. Eu gosto de escrever frases que deixam o leitor na dúvida se é comédia ou tragédia. Gosto de brincar com os leitores: acham que vão rir e eu faço-os chorar, sentem que vem aí uma cena trágica e eu faço-os rir. É uma leitura acrobática.


O humor é considerado por todos uma demonstração de inteligência, porque é que não acontece o mesmo quando chegamos à literatura?


Porque o meio literário está cheio de gente que veio das faculdades e não gosta de ver a inteligência exibida ou desperdiçada no humor. É demasiado rápido para eles. Estão habituados a escrever frases longas e aborrecidas para descrever uma ideia. Eu escrevo para aborrecer e ofender essas pessoas.



(...)

25.3.11

Isto tem de ser dito sem ambiguidades: Eric Idle é o meu Monty Python preferido

Este blog entrou oficialmente em campanha eleitoral

Pedro Duarte, o ministro-sombra do PSD para a área da Educação, acaba de dizer na RTPN que a suspensão da avaliação dos professores (hoje aprovada pela oposição na Assembleia da República) "é uma questão política" e que, por isso, estranha que "o PS venha invocar eventuais ilegalidades e inconstitucionalidades" para pôr em causa "uma escolha política clara do Parlamento". De acordo com Pedro Duarte, suscitar a inconstitucionalidade (neste caso, suponho, com base numa interferência do Parlamento na função administrativa do Governo) é aviltante, porque põe em causa uma escolha clara do Parlamento. Julgo que não darei qualquer novidade ao deputado social-democrata se lhe disser que só se pode suscitar a inconstitucionalidade de um decreto que tenha obtido a maioria clara da Assembleia. É mesmo isto que queremos para o país para os próximos anos?

Nos dias que correm, isto é uma benção

Da confiança: o interesse geral prevalecerá sobre o das corporações

PSD vai aprovar revogação da avaliação dos professores.

Do sentido de responsabilidade

PSD vai aprovar revogação da avaliação dos professores.

Da coragem política

PSD vai aprovar revogação da avaliação dos professores.

24.3.11

Escrutínio democrático

"Os impostos indirectos tratam todos pela mesma medida, tanto pobres como ricos, razão porque são, nesse aspecto, mais injustos. É essa, aliás, a razão porque eu nunca concordei em taxar cada vez mais os impostos indirectos, nomeadamente o IVA. Ele vale 20% para quem tem muito como para quem tem pouco".
Pedro Passos Coelho, no livro "Mudar", editado em 2010.

"Se ainda vier a ser necessário algum ajustamento, a minha garantia é de que seria canalizado para os impostos sobre o consumo, e não para impostos sobre o rendimento das pessoas".
Pedro Passos Coelho, hoje, em Bruxelas.


Elizabete Miranda, Blogue Massa Monetária, Jornal de Negócios

Escrutinar a democracia

Os media, os principais intermediários entre a política e os cidadãos, oscilam frequentemente entre o puro activismo político, adoptando, qual prosélito, pressupostos e pontos de vista que devia apenas relatar, e a noticiação acrítica de contradições. Na política, o escrutínio crítico deve ser uma constante relativamente à acção governativa (em primeiro lugar, pelas suas responsabilidades) mas este princípio deve ser extensível a todos os que actuam no espaço público, nomeadamente aos actores políticos. Os media não cumprem a sua função se se abstiverem de fazer este escrutínio, que deve reconhecer a complexidade da realidade, que é mutável, e respeitar eventuais mudanças de posição, que podem ser compreensíveis. Deve evitar simplificações primárias e crucificações mas tem de exigir explicações.

Straight do the point: o PSD veio hoje dizer que pondera uma subida de IVA como forma de evitar os cortes nas pensões. Ocorrem-me várias coisas para dizer sobre esta posição mas a primeira e mais evidente é: o PSD passou o último ano a acusar o PS de fazer o esforço da austeridade (também) por via da receita (i.e. impostos), quando o correcto seria pelo lado da despesa (os famosos cortes nos consumos intermédios). O PSD passou um ano a repetir diariamente isto. No orçamento, elevou esta preocupação a condição sine qua non para a viabilização do OE 2011. Até aqui tudo bem (vamos esquecer que o PSD se limitava a declarar o seu amor pelos cortes na despesa, sem nunca referir onde).


Hoje (não ontem ou anteontem, quando isto podia ter sido negociado), o PSD apressou-se a declarar que evitaria os cortes nas pensões com o aumento do IVA para 24 ou 25 por cento. Portanto, a única proposta concreta que se ouve do PSD nos últimos tempos é…. um aumento de impostos, da receita. Rematando. O poder fiscalizador dos media não pode limitar-se a divulgar acriticamente uma posição destas, que contraria tudo o que o PSD disse e fez no último ano. Este papel que cumpre à comunicação social é um dos pilares de uma democracia saudável.

Afinal é tudo um logro

Afinal, os downloads nunca prejudicaram a indústria dos conteúdos. Antes pelo contrário. Esta é a Verdade, de acordo com um estudo da London School of Economics. Da London School of Economics, por amor de deus. Aqui.

23.3.11

Morreu Elizabeth Taylor

Para ser sincero, achava que já tinha morrido. Queria agradecer-lhe por ter dado vida um dos melhores filmes de sempre. As interpretações são boas mas nem é isso. Aquele texto, aqueles diálogos, de Tennessee Williams, são magistrais. Uma vez, revi este filme na tv, sem som, incapaz de resistir à intensidade das legendas. Calma. Releio esta última frase e constato que é uma tremenda foleirice. Nada a fazer, foi mesmo assim: incapaz de resistir à intensidade das legendas.

Analyse me

Não é que não seja compreensível mas não deixa de me espantar a quantidade de pessoas que intervém no espaço mediático cujo principal contributo é dizerem "como eu tinha avisado há um ano atrás", "conforme alertei no mês passado"ou "como eu próprio antevi anteontem". Não é que não seja compreensível mas há qualquer coisa de umbiguista nesta obsessão (ou fobia, como diria Bernardino Soares) que me enerva, como se o objecto da sua análise começasse sempre pelos próprios. Claro que na maior parte dos casos são meros profetas do dia seguinte, mas nem é isso que importa. E isto, claro, digo-o há anos.

A frase que impõe respeito

"Em que situação se encontraria o país sem a acção intensa, mas discreta, que exerci no meu mandato? O que seria do país sem os meus alertas durante a crise?"

Em declarações à TSF, Manuel Alegre põe o dedo nas feridas*


Cavaco Silva
«[Cavaco Silva] devia fazer um apelo para que houvesse um diálogo, um consenso e um compromisso», evitando a iminente antecipação das eleições.

Cavaco Silva fez um discurso que «estimulou a crise» na sua tomada de posse.

FMI
«Se este PEC 4 contém medidas duras para os portugueses, a verdade é que a seguir vêm medidas muito mais duras, porque o resgate do FMI [Fundo Monetário Internacional] significa que irão», por exemplo, «baixar o salário mínimo nacional e despedir mais funcionários públicos». Mas também «acabar com o 13.ª mês, mais cortes salariais ou o fim do conceito de justa causa».

Propostas alternativas
«É preciso que os outros partidos, nomeadamente o PSD», apresentem a sua solução alternativa.

Os partidos «tendem a colocar o interesse partidário imediato acima do interesse nacional».

Cultura política
«Esta situação é fruto» da falta de coragem para o diálogo. É preciso «mais coragem para fazer a paz do que para fazer a guerra», a par de um «grande sentimento de responsabilidade nacional».

Eleições antecipadas
O cenário de eleições legislativas antecipadas não vai resolver «coisa nenhuma, mas abrir a porta para que o FMI» entre em Portugal.

PSD
O projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD, «que no fundo é um programa de governo», contém medidas que, conjugadas com a austeridade que é imposta pela Europa, vão tornar muito gravosa a situação dos portugueses».

*Resumo feito a partir do texto da edição online da TSF. Vale, no entanto, a pena ouvir o audio.

21.3.11

Prenhe de razão ou hypersensitive me

Que aquele grupo que ganhou o festival da canção faça uma música com o objectivo de gozar com Miguel Sousa Tavares é coisa que não me perturba. Gozar com alguém é algo que pode ter bastante graça. Isto tem. Isto também. Chamarem-me orelhas, por exemplo, não tem. Não achando graça no passado a estes homens da luta era improvável que achasse agora. Mas o problema da música não é a graça ou a falta dela. Mas uma tentativa de atingir alguém por via de uma ignóbil comparação com o pai. Julgava que isto fosse por demasiado evidente. Parece que não. O que me surpreende não é a música vir de quem vem. Mas que haja tanta gente disposta a ver humor onde apenas parece haver ressentimento e despeito. E tudo isto com o triste patrocínio da comunicação social. Comunicação social que, aliás, no passado fim-de-semana achou bem rerrecorrer à leitura de lábios (é assim que se diz?) para bisbilhotar o que os membros do governo dizem (ou seja, em conversa privada) durante o debate quinzenal no Parlamento. Há crise para além da crise.

Para apreciadores (não sonho mais)

17.3.11

Redes sociais

Recebo um pedido para ser seguido no twitter. O pedido vem apenas identificado com o que parece ser um apelido, que não associo a ninguém. Espreito o perfil do utilizador, que remete para um blog, cujo autor é identificado pelo mesmo nome. Passeio-me durante uns poucos minutos pelo dito. Os minutos alargam-se. Não sei se é muito bom, bom ou mais ou menos. Nem é isso que interessa. Gostei muito de o ler. Senti que olhava para o mundo a partir do mesmo banco de jardim. Bem escrito. Fiquei com vontade de lá voltar. Volto ao princípio. Recebo um pedido para ser seguido no twitter por esta pessoa e não sabia quem ela era. Ao ler o blog, intuo, a dada altura, não sei bem porquê, quem é o seu autor, palpite que (Google) se revela certeiro. O que não deixa de ser curioso dado não saber praticamente nada sobre ele. Curioso não. É absolutamente extraordinário. Pode parecer parvo mas achei engraçado partilhar isto.

"O povo é sereno, os políticos não"

"Senão vejamos. Na quarta-feira passada, o Presidente da República fez o discurso que grande parte do seu eleitorado esperava, mas com alguns anos de atraso. Feito o diagnóstico negro do País, responsabilizou o Governo por isso. Muito bem, está no seu papel. Mas Cavaco iludiu os portugueses ao dizer que é preciso dizer basta à austeridade. Isso é pura demagogia, ainda para mais vindo de um economista. E nunca mencionou o contexto externo em que Portugal se encontra, nem os esforços que têm sido feitos pelo Governo para evitar a ajuda externa. É verdade que Sócrates em 2009 procurou usar a crise internacional como razão e como desculpa. Mas hoje essa acusação é simplesmente facciosa."

(...)

"A maioria dos economistas, da direita à esquerda - de Vítor Bento a Ferreira do Amaral - concordam que um empréstimo como o da Irlanda ou da Grécia seria péssimo para o País. Mas não é só do ponto de vista económico que o exemplo irlandês traz importantes lições para Portugal. Enda Kenny, o novo primeiro-ministro irlandês foi ao último Conselho de Ministros Europeu convencido de que iria renegociar os termos do empréstimo à Irlanda. Não só não conseguiu nada como ainda lhe foi dito que obrigatoriamente a Irlanda tem de subir a taxa de IRC baixíssima de que neste momento as empresas irlandesas beneficiam. Como é evidente, a austeridade agrava-se apesar dos irlandeses terem mudado de governo. "

Marina Costa Lobo, crónica do Jornal de Negócios.

Unwind



SONIA DELAUNAY, RHYTHM, 1938.

16.3.11

Algures no meio deste post está uma ideia que queria transmitir mas não é fácil econtrá-la

Porfírio Silva, em mais um excelente texto, desta feita sobre a entrevista de ontem de José Sócrates.

Concordo genericamente com tudo. Bem, quase tudo. No final, o Porfírio sublinha, e bem, o lugar central que a forma e os procedimentos têm em democracia. “Em democracia, a forma é uma garantia. Ferir a forma não deixa intocado o conteúdo”, escreve. Preciso de pensar um pouco melhor sobre o assunto (em quase todos os assuntos eu preciso de pensar um pouco melhor sobre o assunto… a verdade que eu tenho-me como um moderado mas aquilo que eu sou mesmo é um hesitante profissional) mas julgo que a minha renitência advém de se considerar que os procedimentos informais de relacionamento entre os agentes políticos (seja o Presidente da República, seja o principal partido da oposição) sejam equiparados às regras de forma escritas, normativamente impostas. São estas últimas que sustêm o edifício da democracia e constituem o seu garante. As outras, as tais regras informais (sublinho, regras de forma informais…) fazem parte de outra forma. São politicamente sindicáveis mas não beliscam a democracia.

Isto é tanto mais verdade quando estamos a falar no quadro das relações entre o Governo e um Presidente de um sistema semi-presidencial. Quase por definição, este é um sistema que deixa uma apreciável margem de indefinição nalguns dos poderes destes agentes. Não é por acaso que, contrariamente ao sistema parlamentar puro ou ao presidencial, só se compreendem os poderes dos presidentes nos sistemas semi-presidenciais - e muito em particular os que tangem com a sua relação com os governos - olhando mais para a prática do que para as leis. O Duverger tinha uma expressão sobre isto mas olvida-ma. Ou seja, é um sistema que, no âmbito daquelas relações, permeável à criação de certos hábitos, nomeadamente ao nível de procedimentos (há países com regras semelhantes às nossas que tornaram habitual que o governo auscultasse o Presidente antes escolher o nome de certos ministros, v.g, na Polónia do Presidente Lech Walesa).

Corte abrupto. Fome. Resuma-se: há regras de forma e regras de forma. No caso vertente (ahahah), falamos de regras de forma. Das outras, que espelharão porventura relações de força mas que se situam no campo de discricionariedade política. Que comprometem politicamente mas não juridicamente. Acho que o que queria dizer se resume a esta última frase. Agora, papinha.

15.3.11

Deve ser a isto que chamam escrever direito por linhas tortas



A complacência com que estas declarações (inaceitáveis) de Cavaco Silva estão a ser acolhidas fizeram-me logo lembrar estas palavras:

"É altura dos Portugueses despertarem da letargia"

"A nossa sociedade não pode continuar adormecida"

"É necessário que um sobressalto cívico faça despertar os Portugueses"

No mais, o que há a dizer sobre isto já foi dito neste post de Fernanda Câncio.

Desconstruir o Estado de direito (alerta: post com ligeira manipulação dos factos e de irritante pulsão declamatória)


Uma Conferência "Qualidade do Estado de Direito em Portugal 2005-2010", ICS. Repito, uma conferência sobre a qualidade do Estado de Direito. E não há um único representante da academia jurídica? Sobressaem os sociólogos (muitos), as "autoridades judiciárias" (algumas) e Eduardo Dâmaso, o director-adjunto do Correio da Manhã, esse arauto do respeito pelos direitos dos cidadãos. Claro que o estado de direito é de todos. Nem a visão jurídica que se ensina nas faculdades de direito esgota o tema. Longe disso. Mas a sua ausência não pode deixar de empobrecer qualquer discussão que se pretenda séria (bolas, há muitos anos tinha jurado a mim próprio nunca usar esta expressão, sucedânea das visões Verdadeiras da vida. Damn) sobre o assunto e, pior, parecendo menor, é reveladora de um certo entendimento de Estado de direito que se vai disseminando entre nós. E nem sequer falei da ausência de políticos, os representantes dos cidadãos a quem cabe fazer as escolhas (dentro dos inevitáveis constrangimentos) determinantes da nossa vida colectiva. Um estado de direito a preto e a branco, de virgens e corruptos, de bons e maus, de índios e cowboys. Mas temo que esta seja indignação que já cansa a paciência.

14.3.11

Sejamos mesmo razoáveis

«Un homme de gauche, ce n’est pas nier la réalité. Il faut savoir ce qu’on peut faire. Se donner une ambition un peu au-delà, disserte l’intéressé. Il faut dépasser le possible, mais pas promettre l’impossible

Dominique Strauss-Khan, num artigo que, em bom rigor, é uma boa boste.

Os europeus


Fonte: Guardian ICM poll of Britain, France, Germany, Spain and Poland

11.3.11

Quem põe o dedo no ar?

A propósito deste texto de Rui Herbon no Jugular, alguém devia lançar o seguinte repto (pelos vistos é o que estou a fazer) aos jovens que se revêem nas reivindicações da "geração à rasca" (bolas, por muito que não me identifique com eles, mereciam um epíteto com outra dignidade, vá, com mais estilo): quem teve uma vida mais difícil do que a dos seus pais ponha o dedo no ar. Intuo que sobrariam menos do que os necessários para encher um autocarro. Olho à minha volta e dificilmente encontro, de entre os meus conhecidos e amigos, quem tenha razões para desejar trocar percursos de vida com os seus pais. Claro que isto do meu universo de amigos e conhecidos vale o que vale e, em bom rigor, não deslegitima as suas reivindicações e aspirações. No entanto, retira-a do absurdo guarda-chuva do confronto geracional. Ideia perigosa.

9.3.11

Para mais tarde recordar

Discurso da tomada de posse na integra. Espero que a história faça justiça a este discurso de Cavaco Silva.

Faz mais ou menos dois anos que saí do armário

Calma... bloggicly speacking, claro. "Not that there's anything wrong with that".

Para arrumar as ideias

"Aquilo em Viseu foi um Horror...". Ferreira Fernandes, no Diário de Notícias.

Newsweek

Miguel Esteves Cardoso escreve hoje que a nova Newsweek está melhor do que nunca. Tina Brown explica aqui como já é a nova revista. A explorar quando houver tempo.

Tacticismos

"Podemos gostar mais ou menos da táctica que cada partido assume, considerar que a mesma se adequa mais ou menos ao que o país precisa. Não podemos é considerar que uns agem de forma táctica e outros de forma responsável.", escreve o João Ricardo Vasconcelos, no seu Activismo de Sofá.

Caro Ricardo, colocas bem a questão mas retiras, na minha opinião, a conclusão errada. O juízo de adequação da táctica às necessidades do país é, precisamente, uma das ferramentas fundamentais que temos para avaliar da (ir)responsabilidade da acção partidária. Claro que o que sejam as necessidades do país não será consensual entre os diferentes quadrantes partidários. Mas sempre haverá mínimos denominadores comuns entre todos (eu diria que neste momento a estabilidade governativa devia ser um desses mínimos). Entre as esquerdas, a indesejabilidade de a direita ir para o poder no actual contexto de austeridade, onde não perderia a oportunidade para pôr em prática as suas neosoluções neoliberais, devia ser outro desses mínimos. Se fores capaz de dizer que uma e outra (a estabilidade governativa ou a possibilidade de a direita ser governo nesta altura) te é indiferente, compreendo que não julgues irresponsável a moção de censura do BE. Caso contrário...